CONAMA: definidas competências sobre florestas

21 de agosto de 2012, às 15h12 - Tempo de leitura aproximado: 9 minutos

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Luciano Pizzatto

Após décadas de tentativas em organizar um processo sistêmico com capilaridade entre a União, Estados e Municípios na gestão e poder licenciatório do uso de florestas nativas, a Lei 4.771/65, com a alteração dada no seu artigo 19° através do art. 83 da Lei nº 11.284, de 2 de março de 2006, acabou estabelecendo as competências dos entes federados para autorizar a exploração de florestas e formações sucessoras.

Pode não ser a melhor solução, mas elimina embates políticos e saneia o mais grave problema da luta de poder e da necessidade local de tomada de decisões.

Mas o artigo 83° manteve a lacuna de precisar normatizar o que vem a ser impacto ambiental nacional ou regional:

“Art. 83. O art. 19 da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 19. A exploração de florestas e formações sucessoras, tanto de domínio público como de domínio privado, dependerá de prévia aprovação pelo órgão estadual competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, bem como da adoção de técnicas de condução, exploração, reposição florestal e manejo compatíveis com os variados ecossistemas que a cobertura arbórea forme.

§ 1o Compete ao Ibama a aprovação de que trata o caput deste artigo:

I – nas florestas públicas de domínio da União;

II – nas unidades de conservação criadas pela União;

III – nos empreendimentos potencialmente causadores de impacto ambiental nacional ou regional, definidos em resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA.

§ 2o Compete ao órgão ambiental municipal a aprovação de que trata o caput deste artigo:

I – nas florestas públicas de domínio do Município;

II – nas unidades de conservação criadas pelo Município;

III – nos casos que lhe forem delegados por convênio ou outro instrumento admissível, ouvidos, quando couber, os órgãos competentes da União, dos Estados e do Distrito Federal.

§ 3o No caso de reposição florestal, deverão ser priorizados projetos que contemplem a utilização de espécies nativas.”

Rapidamente, contrariando a morosidade de outros casos, o CONAMA aprovou a Resolução 378/2006, definindo quais são os critérios para os empreendimentos potencialmente causadores de impacto ambiental nacional ou regional.

A relação áreas X atividade mantém uma grande subjetividade, onde a escala não necessariamente garante a existência de impacto, bem como a existência de espécies ameaçadas adotando a lista do CITES também poderá gerar conflitos em regiões como a Amazônia, onde algumas espécies desta lista existem de maneira dispersa por imensos territórios.

Mesmo assim, seu teor é objetivo e, além de garantir direitos e obrigações, induz a responsabilidade dos Estados em assumirem seus conflitos e propostas de soluções imediatamente.

“RESOLUÇÃO Nº 378, DE 19 DE OUTUBRO DE 2006

Define os empreendimentos potencialmente causadores de impacto ambiental nacional ou regional para fins do disposto no inciso III, § 1º, art. 19 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, e dá outras providências.

O CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE-CONAMA, no uso de suas competências previstas na Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, regulamentada pelo Decreto no 99.274, de 6 de julho de 1990, e tendo em vista o disposto em seu Regimento Interno, anexo à Portaria no 168, de 10 de junho de 2005; e

Considerando a necessidade de se definir quais são os empreendimentos potencialmente causadores de impacto ambiental nacional ou regional para fins do disposto no inciso III, §1º, do art. 19 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, alterado pelo art. 83 da Lei nº 11.284, de 2 de março de 2006, que estabelece as competências dos entes federados para autorizar a exploração de florestas e formações sucessoras, resolve:

Art. 1º Para fins do disposto no inciso III, §1º, art. 19 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, com redação dada pelo art. 83 da Lei nº 11.284, de 2 de março de 2006, compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA a aprovação dos seguintes empreendimentos:

I – exploração de florestas e formações sucessoras que envolvam manejo ou supressão de espécies enquadradas no Anexo II da Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção – CITES, promulgada pelo Decreto nº 76.623, de 17 de novembro de 1975, com texto aprovado pelo Decreto Legislativo nº 54, de 24 de junho de 1975;

II – exploração de florestas e formações sucessoras que envolvam manejo ou supressão de florestas e formações sucessoras em imóveis rurais que abranjam dois ou mais Estados;

III – supressão de florestas e outras formas de vegetação nativa em área maior que:

a) dois mil hectares em imóveis rurais localizados na Amazônia Legal;

b) mil hectares em imóveis rurais localizados nas demais regiões do país;

IV – supressão de florestas e formações sucessoras em obras ou atividades potencialmente poluidoras licenciadas pelo IBAMA;

V – manejo florestal em área superior a cinqüenta mil hectares.

Parágrafo único. A exploração de florestas e formações sucessoras deverá respeitar as regras e limites dispostos em normas específicas para o bioma.

Art. 2º Os entes federados poderão celebrar instrumentos de cooperação para exercerem as competências previstas no art. 19 da Lei nº 4.771, de 1965, com redação dada pelo art. 83 da Lei nº 11.284, de 2006.

Art. 3º A autorização para manejo ou supressão de florestas e formações sucessoras em zona de amortecimento de unidade de conservação e nas Áreas de Proteção Ambiental – APAs somente poderá ser concedida pelo órgão competente mediante prévia manifestação do órgão responsável por sua administração.

Parágrafo único. O órgão ambiental responsável pela administração da unidade de conservação deverá manifestar-se no prazo máximo de trinta dias a partir da solicitação do órgão responsável pela autorização.

Art. 4º A autorização para exploração de florestas e formações sucessoras que envolva manejo ou supressão de florestas e formações sucessoras em imóveis rurais numa faixa de dez quilômetros no entorno de terra indígena demarcada deverá ser precedida de informação georreferenciada à Fundação Nacional do Índio – FUNAI, exceto no caso da pequena propriedade rural ou posse rural familiar, definidas no art. 1º, § 2º, inciso I da Lei nº 4.771, de 1965.

Art. 5º Aplicam-se a esta Resolução, no que couber, as disposições da Resolução CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997.

Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

MARINA SILVA
Presidente do Conselho
Publicado no DOU, de 20/10/2006.”

Do texto, destaca-se uma visão realista de espaço e tempo, fugindo de textos inaplicáveis que em alguns outros casos tentavam falar em limites de alguns hectares ou poucos metros cúbicos por propriedade, em um pais com bilhões de m3 de potencial manejável, milhões de hectares em expansão, e outros milhões com necessidade de recuperação.

Sua leitura leva apenas a consulta externa da lista do Inciso I e II do CITES, corretamente adotado por ser o instrumento oficial de convenção e responsabilidade internacional do Brasil, que, ao contrário da lista das espécies ameaçadas de extinção, não se limita a avaliações subjetivas. Por sinal, esta última possui grande mérito na tentativa de indicar políticas para algumas espécies que se contrapõem à falta de permitir e considerar as condições regionais, onde determinada espécie eventualmente considerada em risco pode ter regionalmente alta população e abundância.

A lista do CITES é periodicamente atualizada, após reuniões e negociações internacionais, sendo a mais recente a aprovada pela IN 011/2005:

“INSTRUÇÃO NORMATIVA N° 11, DE 17 DE MAIO DE 2005

A MINISTRA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE, no uso das atribuições legais, e tendo em vista o disposto na Lei n° 10.683, de 28 de maio de 2003, e suas alterações, e o disposto no art. 24 do Decreto n° 3.607, de 21 de setembro de 2000, que dispõe sobre a implementação da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção – CITES, promulgada pelo Decreto n° 76.623, de 17 de novembro de 1975, alterado pelo Decreto n° 92.446, de 7 de março de 1986 e o que consta do Processo n° 02001.000041/2005-34, resolve:

Art. 1° Publicar as listas das espécies incluídas nos Anexos I, II e III da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção – CITES.

Art. 2° Esta Instrução Normativa entra em vigor na data da sua publicação.

Art. 3° Fica revogada a Instrução Normativa n° 002, de 26 de maio de 2003, publicada no Diário Oficial da União de 28 de maio de 2003, Seção 1, páginas 69 a 88.

MARINA SILVA
Publicado no DOU, 8 de junho de 2005.

Listas das Espécies Incluídas nos Anexos da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção – CITES
(Segue uma longa lista …)”

A lista sofreu algumas inclusões, através da Instrução Normativa 052, também de 2005, e pode ter conflito com a IN 05/2004, que também publicou lista do CITES, mas sendo a IN n° 11/2005 a mais recente, deve ser adotada como a lista aplicável, salvo nova publicação.

Com estes critérios também eliminou-se conceitos genéricos como “biomas” do tipo cerrado, mata atlântica, araucárias, e outros, que não permitiram até hoje soluções eficientes.

É fundamental também entender a diferença da lista do CITES e seus anexos I e II, com outras listas, como por exemplo o caso da Araucária angustifolia, do Sul do Brasil, que no CITES só possui citada na família Araucariaceae a espécie Araucária araucana, com distribuição na Argentina e Chile, não se aplicando à espécie brasileira.

Cabe agora que os Estados assumam o controle e gestão das florestas nativas, em especial nas regiões de maior conflito como o Sul do Brasil, o cinturão de desmatamento da Amazônia, e regiões de Mata Atlântica do Nordeste, e que também passem aos Municípios a responsabilidade pela gestão de suas florestas, em especial os problemas domésticos como arborização urbana e outros.

Avançar a Resolução CONAMA nas áreas de conflito como as de amortecimento, entorno de reservas indígenas e as APAs Federais.

E por último, realmente priorizar a reposição florestal com espécies nativas, e preferencialmente, adotando o critério de área por área (em dimensão) e não volume por número de árvores, como prevê a legislação de alguns Estados e discutidos há décadas pelo setor florestal.

Luciano Pizzatto é engenheiro florestal e empresário, Diretor de Parques Nacionais e Reservas do IBDF/IBAMA 88/89, Deputado de 1989/2003, detentor do Prêmio Nacional de Ecologia.