Balas perdidas nas decisões públicas

21 de agosto de 2012, às 15h12 - Tempo de leitura aproximado: 2 minutos

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Sátyro Pohl Moreira de Castilho, engenheiro civil, presidente do Crea-MT

A violência na favela da Rocinha, Rio de Janeiro, poderia ocorrer em praticamente qualquer grande centro do país. Não é uma exclusividade do Rio de Janeiro. Os acontecimentos envolvendo tráfico de drogas e segurança pública relacionam-se a diversos fatores que, como bem disse Arnaldo Jabor em comentário no Jornal Nacional, encontram pela frente a omissão de governos, de Forças Armadas, de sociedade etc. O que quero dizer aqui é que o problema da violência nos morros do Rio de Janeiro ou na periferia de Cuiabá está relacionado também às profissões do Sistema Confea-Crea. Nenhum projeto digno de segurança pública pode ser concretizado sem tais profissões.

Um ponto positivo na divulgação dos fatos ocorridos no Rio de Janeiro é a lembrança de que de nada adianta combater o tráfico nas cidades litorâneas sem que haja uma preocupação com as fronteiras. A rediscussão do papel das Forças Armadas é essencial, porém dentro de um contexto em que se redefina também o papel da Polícia Federal e das polícias civil e militar. E que tal debate seja viabilizado não apenas no caráter repressor, mas também com forte apelo de atendimento social e econômico. Sem isso, armas e drogas continuarão passando pela fronteira como moeda de pagamento a veículos e cargas roubadas no Brasil.

Há cinco anos, aproximadamente, o noticiário em Mato Grosso divulgou a vinda para o Estado de um nome do primeiro escalão do governo federal, cuja missão seria sobrevoar a fronteira com a Bolívia, anotar os problemas e buscar soluções. Ele entrou no helicóptero, junto com o secretário de Segurança Pública na época e com alguns repórteres, viu, ouviu e foi embora para Brasília fazendo promessas. Até hoje, nada retornou como resultado dessa viagem.

Tal fato ocorreu no desenrolar da CPI do Narcotráfico, da qual todos se lembram. A CPI passou e tudo continuou como era antes. Na verdade, falta planejamento ao país, não qualquer planejamento, com letras rápidas em algum arquivo powerpoint ou similar, mas planejamento integrado, interdisciplinar e com decisões técnicas obedecidas. Hoje, sabemos todos, as decisões são políticas em todos os níveis: municipais, estaduais e federal. A distribuição dos recursos orçamentários não obedece a lógica das necessidades técnicas, mas – sim – o peso do lobby político, do poder de barganha entre legislativos e executivos.

Enquanto a prática política não for técnica, teremos as cenas da Rocinha, teremos os roubos de cargas e veículos para fazer moeda de troca com armas e drogas, teremos uma situação de violência que se agrava com o cobertor curto do orçamento federal. Ou o poder público, aqui entendido em todos os níveis e esferas, se adequa à discussão técnica e define um cronograma de ações pontuais a curto, médio e longo prazo, ou continuaremos pagando mais de 35% do Produto Interno Bruto (PIB) em carga tributária sem praticamente qualquer retorno e contabilizando, cada vez mais, maior volume de balas perdidas.

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Este espaço é atualizado toda segunda-feira. Publicado em 19/04/2004