A Geologia do Portão do Inferno

21 de março de 2023, às 15h45 - Tempo de leitura aproximado: 3 minutos

Compartilhar esta notícia

O Portão do Inferno, local existente na MT 251 entre Cuiabá e Chapada, sempre despertou a atenção de muitas pessoas da região, devido ao abismo e a bela paisagem. Mas como se formou esse local?

Todas as paisagens que observamos é resultado da interação entre processos geológicos relacionados a dinâmica interna da terra, formam e transformam as rochas, e os processos da dinâmica externa, tais como condições climáticas, chuvas, ventos e outros agentes que atuam na erosão das rochas e solos.

No Portão do Inferno existem três unidades geológicas diferentes, o Grupo Cuiabá, a Formação Furnas e a Formação Botucatu, e elas foram fundamentais para que fosse formado este local da forma como conhecemos hoje. As rochas destas unidades se formaram em diferentes momentos da história do planeta, e estão sobrepostas, como se fosse um bolo. Cada conjunto de rochas que foi citado, é separado do outro por muitos milhões de anos de diferença de idade.

A primeira unidade (Mais antiga) é o Grupo Cuiabá, composto por rochas metamórficas que guardam a história de um processo de abertura e fechamento de oceano. No nosso planeta as placas tectônicas atuam de forma contínua. A África e a América do Sul, por exemplo, se afastam cerca de 2 centímetros por ano. Por outro lado, o oceano pacífico se fecha alguns centímetros a cada ano. Isso significa de daqui algumas dezenas ou centenas de milhões de anos, o oceano Pacífico iria se fechar, e as Américas se encontrarão com Ásia ou a Austrália, e formarão um único continente. Um processo similar a esse ocorreu com as rochas do Grupo Cuiabá, que conta um processo completo, de abertura e fechamento de um oceano com a formação de uma grande cordilheira parecida com Himalaia, que se estendia desde a região de Cuiabá até a divisa com Goiás e parte do Mato Grosso do Sul. Estas rochas possuem idade entre cerca de 1 bilhão de anos e 500 milhões de anos. No portão do interno elas estão no fundo do abismo, e são os mesmos tipos de rochas encontradas em muitos locais da baixada cuiabana.

Já as rochas da Formação Furnas registram um oceano que recobriu a borda oeste do que hoje é a América do Sul, entre 410 e 360 milhões de anos. As rochas arenosas que compõem essa unidade, podem ser observadas de desde a base do abismo, até a base da estrada. O leitor quando for a Chapada, pode reparar que as rochas da porção inferior do portão do inferno são arenitos com coloração bege.

A Formação Botucatu, é composta pelos arenitos vermelhos, formados em um grande deserto parecido com o Saara, que recobriu parte da américa do Sul, no final do período Jurássico e início do período Cretáceo, algo entorno de 150-140 milhões de anos. Essas rochas formam os paredões vermelhos da Chapada dos Guimarães que estão à esquerda da estrada, para quem está subindo de Cuiabá para Chapada. Nesta unidade geológica o leitor consegue observar marcas do que eram as antigas dunas que formavam o antigo deserto.

No percurso entre a Salgadeira e o Curva da Mata Fria, a estrada passa exatamente nesta superfície que separam as formações Furnas e Botucatu. A lenta evolução do relevo, fez com que esse contato fosse o melhor local para subir da baixada cuiabana para Chapada dos Guimarães, isso porque as diferenças nas rochas propiciaram o desenvolvimento deste patamar no qual passa a estrada.

Outro fato interessante é que as mesmas rochas que hoje formam os paredões de Chapada dos Guimarães, em algum momento já recobriram também a região de Cuiabá. A queda de blocos rochosos na estrada, ou em outros locais, são a demonstração do processo natural de recuo destes paredões. Isso significa que daqui alguns milhares ou milhões de anos, a escarpa estará ainda mais recuada e o relevo será bem diferente do que é hoje.

Quando você viajar e olhar a paisagem, saiba sempre que ela é resultado da interação entre processos geológicos e climáticos, que controlam a formação do solo e o modelamento do relevo e da geomorfologia. Claro que esse processo demora milhares ou milhões de anos, mas é sempre bom pensar e tentar imaginar como era o nosso planeta em outros tempos.

Caiubi Kuhn, Professor na Faculdade de Engenharia (UFMT), geólogo, especialista em Gestão Pública (UFMT), mestre em Geociências (UFMT).